"Viver, simplesmente viver, meu cão faz isso muito bem".
Alberto da Cunha Melo

Saturday, December 27, 2008

Carlos Drummond de Andrade

Poesia

Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia desse momento
inunda minha vida inteira.

Carlos Drummond de Andrade
(1902-1987)

Friday, December 26, 2008

Lindo poema de Chesterton

THE DONKEY

When fishes flew and forests walked
And figs grew upon thorn,
Some moment when the moon was blood,
Then surely I was born;

With monstrous head and sickening cry
And ears like errant wings,
The devil's walking parody
On all four-footed things.

The tattered outlaw of the earth,
Of ancient crooked will;
Starve, scourge, deride me: I am dumb,
I keep my secret still.

Fools! For I also had my hour;
One far fierce hour and sweet:
There was a shout about my ears,
And palms before my feet.

(G. K. Chesterton)

Poema de Natal, de Vinicius de Moraes

Poema de Natal

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados,
Para chorar e fazer chorar,
Para enterrar os nossos mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses,
Mãos para colher o que foi dado,
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida;
Uma tarde sempre a esquecer,
Uma estrela a se apagar na treva,
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar,
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço,
Um verso, talvez, de amor,
Uma prece por quem se vai -
Mas que essa hora não esqueça
E que por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre,
Para a participação da poesia,
Para ver a face da morte -
De repente, nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte apenas
Nascemos, imensamente.

Vinícius de Moraes

GENUÍNA MUNDANIDADE (D. Bonhoeffer)

O manuscrito com esta citação estava sobre a escrivaninha de Bonhoeffer na Marienburger Allee quando ele foi preso em abril de 1943 por seu envolvimento numa conspiração para eliminar Hitler:

"As ideologias descarregam sua fúria sobre os seres humanos e depois deixam-nos da mesma forma que um pesadelo deixa a pessoa que desperta dele. Sua lembrança é amarga. Não tornaram a pessoa mais forte ou mais madura, apenas mais pobre e mais desconfiada. Minhas atividades recentes, que têm se desenrolado predominantemente na esfera secular, dão-me muito que pensar. Impressiona-me o fato de viver, e poder viver, por dias sem a Bíblia; se me obrigasse a lê-la sentiria estar fazendo isso por auto-sugestão, não por obediência [...] Sei que basta abrir meus próprios livros para ouvir o que pode ser dito contra essa postura. E não quero também me justificar, porque sei que “espiritualmente” já experimentei períodos muito mais ricos. Porém sinto apenas crescer minha resistência contra tudo que é “religioso”.
Vida, autenticidade, liberdade e compaixão significam muito para mim; apenas suas manifestações religiosas é que são tremendamente sem atrativos. A cruz de expiação é a liberação para uma vida diante de Deus em meio a um mundo sem deus; é a liberação para uma vida de genuína mundanidade/identificação com o mundo".

Ao mestre Bonhoeffer

O Cristianismo é um verdadeiro paraiso de grandes mentes e grandes mestres. Para mim, o maior deles no seculo XX foi Dietrich Bonhoeffer. O homem que ensinou com a propria vida o sentido de "conceito e vivencia", que se doou inteiramente por aquilo em que acreditava. E que nos deixou um legado em obras realmente magnificas e apaixonantes.

Vivemos realmente numa era sem grandes herois. Os idolos que inspiram a nossa geracao sao tao vazios quanto essa geracao. Sao a melhor expressao daquilo que poderiamos chamar de "idolos de barro". E estao por toda parte, no ultimo Big Brother, nas revistas de modas e tendencias, no novo album musical que depois de amanha virara "classico". Nao produzem nada que realmente transforme vidas, que de um sentido duradouro a existencia de todos os seus admiradores.

Bem, dira alguem, isso sempre existiu. Sempre houveram os demagogos, os sofistas, aqueles que encantam a massa com truques baratos e cosmeticos. Sim, direi eu. Mas parece-me que a nossa epoca tem um diferencial. A nossa epoca coroou este homem mediocre. No nosso seculo isso se tornou regra, modelo de perfeicao, centralidade. Na nossa era, os anoes nao mais se reconhecem como anoes e decidem se sobem ou nao nas costas dos gigantes. Agora, os anoes derrubam os gigantes e os obrigam a andar na mesma estatura de nanismo.


A cultura kitsch
definitivamente tomou todo o espaco da grande cultura. Alias, usar a expressao "grande cultura" hoje em dia é um verdadeiro pecado. Pecado mortal. Uma expressao que, alias, deve-se ser evitada nas proximidades daqueles que deveriam ser os primeiros a defende-la (como a classe dos intelectuais e dos academicos). Falar sobre alta cultura, homem superior e coisas do genero causa verdadeiro alvoroco. E voce pode receber alcunhas novas, dessas que nunca pensou que seria chamado, como fascista, extremista, anti-socialista (e, nao apenas para completar a musica do Raulzito, "eu admito, voce ta na pista"). De qualquer forma, todas estas alcunhas tem todos e nenhum sentido. Sao, elas tambem, cosmeticos para evitar uma verdadeira reflexao sobre o tema.

Nao significa que nao temos, realmente, herois em quem possamos nos espelhar. O que ocorre é que a cultura inferior, de massa, sufoca a apresentacao destes herois. Somos apresentados, diariamente, a todos estes substitutos entorpecentes do show business, da ultima moda, que nunca sacia aquela fome interior, profunda, que, no final das contas, da-se por ignorada.

Mas, conforme me ensinou Joseph Campbell, heroi
é aquele que deu a propria vida por algo maior que ele mesmo. Para mim, estas pessoas chegaram a um nivel de realizacao existencial pela qual vale a pena almejar. Aquela inquietacao da existencia, as perguntas por sentido e a propria preocupacao advinda da ressonancia do interior do nosso ser que nos faca realmente sentir o enlevo de estarmos vivos encontram no exemplo destes homens a certeza de que nao tracamos o caminho sozinhos; os herois de todos os tempos enfrentaram os mesmos riscos antes de nos. No fim do labirinto, quando pensavamos que estariamos sozinhos, estariamos na companhia do mundo todo. Temos apenas que seguir a trilha do heroi.

Por estes herois
é que tenho buscado. E entao eles me convidam para andar pelas mesmas veredas. Sao pessoas como Jesus, Socrates, Pitagoras, Bonhoeffer e Schweitzer, por exemplo, que realmente fazem a minha cabeca, que me inspiram. Sao os meus herois.

Na proxima postagem vou transcrever um dos trechos mais magnificos do mestre Bonhoeffer. Aguardem uns 30 segundos.


ps: Nao
se enganem pensando que ja aderi, com 4 dias de antecedencia da vigencia, ao Acordo Ortografico da Lingua Portuguesa. Eh que ainda nao aprendi a operar esse teclado norte-americano sem tils e cedilhas.

No comeco sempre doi, mas dizem que depois fica bom e a gente tem ate arrepios de prazer...

Pois é. Aqui estou, iniciando um blog. Na verdade, nao tenho a minima ideia de como isso funciona (se é que isso vai funcionar mesmo...). Nunca fui muito bom com coisas "modernas". Admiro meus dois irmaos, que sabem tudo desse mundo virtual. E, como me acostumei a sempre buscar ajuda deles quando preciso de algo, nunca me dei a realmente saber fazer as coisas acontecerem aqui. Entao, pra sair dessa vida de alienacao, resolvi instalar o iTunes e criar um blog.

Nao creio que eu va falar muito de mim aqui. Por dois motivos principais: 1) Nunca fui dado a me abrir muito, exceto depois de um longo tempo de silencio, e 2) Nao acredito muito no poder transformador da palavra, essa com "p" minusculo, opinativa, diaria, de periodicos e artigos; acredito numa busca com resultados mais lentos e duradouros. Pelo menos,
é o que busco.

Pensando bem, essa historia de blog realmente vai dar trabalho. E, para fazer jus ao meu espirito indisciplinado, certamente nao irei atualiza-lo diariamente. Talvez semanalmente. Ou, talvez,...

E, pra finalizar isso que "quis ser uma introducao mas nao pode", justifico o titulo do blog como uma citacao de Mario Ferreira dos Santos, que, para mim,
é a melhor inteligencia do Brasil de todos os tempos. Assim é a forma como ele concebia que deve ser o espirito filosofico. E é assim que me parece o dever-ser de uma vida digna de ser vivida.