"Viver, simplesmente viver, meu cão faz isso muito bem".
Alberto da Cunha Melo

Friday, June 5, 2020

São Paulo, a Sinfonia da Metrópole 2

SÃO PAULO, A SINFONIA DA METRÓPOLE 2
(Para ler ouvindo a valsa Arranha-Céu, na voz de Silvio Caldas)

“Intervenção militar com Bolsonaro no poder!”, gritava um amontado de gente ao redor de um carro de som na Paulista, enquanto eu atravessava a avenida para buscar umas coxinhas no fascista Ragazzo. O grupo de tarados por coturno, como sempre, era formado por senhoras da terceira idade e cinquentões marombados com calças camufladas: “meu pai era militar e lá em casa tinha ordem”, me diriam se eu houvesse perguntado.

“Intervenção militar com Bolsonaro no poder!”, e aos poucos os discursos inflamados iam se misturando com o ruído de uma Paulista récem aberta ao vai-e-vem dos carros, mas ainda era possível ouvir referências a 1964, AI-5, militares, ordem, “acabar com esse Congresso que tá aí” e tudo o que eu já estou careca. De saber.

Foi o Zé Murilo de Carvalho quem abriu nossos olhos para o fato de que, na América Latina, existe uma convergência para o presidencialismo de caráter imperial, uma tendência ao presidencialismo absolutista. E o ex-ministro do STF, Victor Nunes Leal, sacaria logo o seu clássico “Coronelismo, Enxada e Voto” para mostrar as origens dessa moda.

Nenhum líder carismático de direita deste país teve uma base de representação popular (Jânio, Collor e Bolsonaro). E o presidencialismo de coalizão parece ser uma exigência num caso de partidarismo fragmentário. Maldita sina: ou ele é de coalizão ou é um projeto cesarista. Cesarista como define Gramsci, é claro.

A tara por coturno obscurece a compreensão de que, para Bolsonaro, não existe nenhuma hipótese equivalente a 1964. Em 1964, o golpe foi realizado por forças de oposição, não de continuidade. E em 64 o que houve foi um regime autoritário comandado por um conselho do Estado Maior das FFAA’s, com um rodízio presidencial subordinado a este conselho. Bolsonaro não teria a menor chance de participar de algo como 1964 porque não faz parte das FFAA’s. Olhos azuis brilhantes não é posto.

O que ele poderia implementar seria um cesarismo no modelo do Estado Novo de 1937, de continuidade and all that jazz. Mas mesmo a fórmula cesarista exige líderes com alguma sofisticação de articulação política, o que não é o caso.

De qualquer forma, sugiro às tias (agora da Paulista, que abandonaram o zap) um outro canto de guerra: “Novo Estado Novo, com Bolsonaro no poder!”