"Viver, simplesmente viver, meu cão faz isso muito bem".
Alberto da Cunha Melo

Saturday, August 29, 2009

A eloquência daqueles olhos

Um olhar. Foi esta a refutação que hoje me deu uma criança a toda fala dos filósofos da linguagem sobre a mediação linguística do mundo (e do corpo). Não, não houve linguagem, não houve palavra, não houve verbo, nem substantivo, adjetivo também não houve. Apenas dois olhinhos que adentraram meu olhar. Não houve palavra, não precisou. O som do silêncio. A eloquência de um olhar. Dor? Curiosidade? Fome? Inocência? Infância? Alegria? Tristeza? Não. A linguagem foi frustrante naquele momento. Nenhuma palavra traduzia aquele olhar. Talvez toda a Humanidade, talvez tudo o que nos faz humanos, talvez toda a alma. Ainda não. Era mais. Muito mais que isso.
O olhar daquela criança não tinha idioma, não tinha raça, não tinha cor. Era o Tudo, era o Verbo Encarnado, era a Humanidade. E era mais que tudo isso também. Foi tão grande, tão intenso, tão maior que tudo, tão maior que qualquer emoção que jamais senti.
Wittgenstein disse que os limites da minha linguagem denotam os limites do meu mundo. Mentiu. Eu nunca terei linguagem suficiente para aquele olhar e mesmo assim o senti. Transcendeu os limites da minha linguagem. Me guiou por tão longe, outro mundo, mas, ainda assim, eu poderia reconhecer, era minh’alma. O vôo daquele segundo foi infinito. Fui tocado mais do qualquer palavra, em qualquer idioma, poderia me afetar.

Ou talvez seja mesmo a linguagem, mas aquela dita por T.S. Eliot, que desconhece as palavras mas habita a Palavra. O Verbo.

Qual rosa cuja mera contemplação parece insuficiente, dei as mãos praqueles olhinhos e, surpresa!, os olhinhos acariciaram meus dedos. Toda aquela tão forte efusão de Verbo materializou-se, então, numa gota de lágrima no meu rosto mudo..

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